terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Comunicação

Percebeu de repente que praticamente tudo no mundo – se não tudo mesmo – era uma questão de comunicação. Seu conhecimento de si mesma, dos outros sobre ela e dela sobre os outros, isso era óbvio. Mas muito além disso, suas sensações nada mais eram que uma comunicação também. Seu conhecimento do mundo, seu paladar, seu tato, audição, visão eram uma comunicação. Um diálogo entre ela e o mundo. Constantemente. Viver era comunicar-se e comunicar-se era imperfeição. Vai ver, ela pensou, o mundo em si – seja lá o que isso for (concreto ou só uma miragem...) – talvez não seja imperfeito. Imperfeita era a comunicação e o que se interpreta a partir dela. A livre interpretação e a comunicação eram o problema. E problema não passava também de uma ideia imprecisa pessoal que temos por causa da comunicação.
Era isso o que ela contava para a amiga agora e essa mesma amiga respondeu: Hum... É, eu gosto de conversar também, bastante!
Porque na verdade não era a hora nem o momento, a amiga estava escolhendo uma roupa na loja de departamento. Ela pensou: escolher roupa também é tudo, tudo uma comunicação, está vendo?
Ela se sentia só. Porque sua comunicação sempre, sempre não chegava ao outro. Esse momento era só um exemplo. Era como o mundo que todos tentavam decifrar e não conseguiam: isolado. Todos isolados pelo efeito da comunicação. Em vez de comunicar-se todos se... como diz o ditado? Se estrumbicavam. E não pela falta de comunicação, pela presença dela em tudo. Suas ideias eram incomunicáveis ou pelo menos apenas deformadamente comunicáveis.
- É como se fôssemos todos surdo-mudos, entende? Mas num sentido amplo! Porque a gente nunca vai conseguir dizer o que realmente queremos, sentindo e ser entendido.
A amiga respondeu franzindo a sobrancelha. Só por alguns segundos porque ela também respondeu:
- Ah, mas você acha que eu não entendo as coisas que você diz? A gente entende...
E continuou olhando as blusas penduradas.
Ela pensou que o franzir de sobrancelhas dizia tudo. Que de fato ela tinha toda a razão. Ou – humildade de praxe – ela queria ter a razão e preferiu o franzir de sobrancelhas. O que também não desqualificava sua opinião! Preferiu mudar de assunto, porque se buscava um entendimento neste, já tinha tirado toda a conclusão que ela achou que precisava.
Mas também... Ela tinha que levar em conta que a amiga não estava interessada naquilo naquele momento e o interesse é um dado importante na comunicação.

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