segunda-feira, 6 de novembro de 2006

Poética

Tenho leis de como se deve escrever - que só servem pra mim mesma e pro meu gosto. Uma delas é, como já indicavam os modernistas (e a Bel me avisou primeiro), a de não usar pronome oblíquo. Pretérito mais-que-perfeito também não, não muito, quase nunca. Tudo isso deixa o texto pretensioso e sem estilo. Sentimentos já feitos também não: "ela se sentia deprimida". Deprimida não é tudo, é genérico, descreva como ela se sentiu, aproxime o leitor dela, transfira a sensação dela para o leitor, porque deprimida é constatação, entrar na pele é literatura. Evitar frases feitas. Mas não é um manual isso, eu já disse, é o que acho importante, não pensem que meu desmazelo é só falta de zelo, é técnica também (eu estou sendo irônica).
Aí entram as palavras. Pra mim palavras grandiosas não me cabem, eu tenho medo da eloqüência porque sou insegura, porque me acho pequena demais pra palavras grandes e tenho medo que me apontem depois e me digam: uiii a senhorita que se acha a escritoooura! Não, pra mim as palavras devem ser simples, sem pretensão, a não ser que as palavras sejam bonitas, como acontece com o estilo do Diego. Pra mim as palavras precisam ser simples, bem simples, a forma de usar é que não é simples. Precisam ser tão simples, tão simples que a idéia mais complexa fique óbvia e daí venha a graça - acho que isso aprendi do Machado.
Minha escrita é medrosa pela simplicidade e também pelo afastamento. Eu tenho horror de entregar as coisas. Como aquela frase do conto que diz "eu sou abusada pela minha própria mãe", eu tive, eu fui obrigada a escrever, mas eu me senti humilhada quando minha amiga citou ela pra me dizer que tinha lido o conto. E ainda disse com entonação de novela mexicana, me senti um lixo. Ainda assim fico feliz porque pelo menos duas pessoas leram o conto e nem perceberam que ela era abusada pela mãe, interpretaram só um relacionamento difícil entre mãe e filha. Dizer "eu sou abusada pela minha própria mãe" é como dizer que fulana estava deprimida, percebem? Justamente porque a intenção era dizer que isso realmente não é tudo.
Eu sou muito lógica, geralmente tenho medo de poesia... não sei interpretar a contento, e Manuel Bandeira me faz ficar envergonhada porque (porque ele é eloqüente e mistura isso com simplicidade, é como se fosse ingênuo) essa frase do poema Namorados (poema ótimo, eu sei): "A meninice brincou de novo nos olhos dela", pra mim tira por uma linha a simplicidade do texto e estraga ele um pouco. É o tipo de frase que eu usaria e depois ao reler ficaria extremamente envergonhada. É a mesma sensação de quando a gente sonha que sai e esqueceu de pôr a roupa. A vergonha, uma bofetada de presunção mal colocada (essa frase é pretensiosa!), que diz: como fui estúpida, ingênua, suja. E, realmente, é como quando a gente quer resumir e não consegue um texto. A gente quer passar uma idéia e não sabe de outro jeito que não saia parnasiana.
E eu acho que peso a mão na simplicidade, meu texto tem passado do simples pro simplório. Enfim, eu tenho medo com palavras, preguiça de rescrever também. Lembro de quando me metia a escrever um romance e quando retomava no dia seguinte, retomava só pra corrigir, corrigir as palavras mal postas, e não escrevia mais nada. Os romances eram ruins, de qualquer forma =). Eu rescrevia o início só pra reparar que ele era porco afinal - eu tinha leituras ruins.

Por falar nisso eu estava pensando em ser uma escritora ultra-revolucionária pós-pós-pós-modernista e criticar os próprios modernistas (como eles faziam com seus antepassados). Que tal esta:

Encanto

Eu faço versos como quem faz versos.
Ói que pássaro bonito!
Vou escrever uma poesia sobre vôo.

Hem? Hem? Ou alguém já teve essa idéia capciosa antes?

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