Dizia Gândavo sobre a língua tupi e seus falantes: “(...)não se acha nela F, nem L, nem R, coisa digna de espanto porque assim não têm Fé, nem Lei, nem Rei, e desta maneira vivem desordenadamente(...)”. Coisa que já ouvi reproduzida pela minha mãe (deve ter aprendido na época da ditadura, na qual havia educação de verdade) como a grande sacada universal sobre o Brasil e o que devemos combater (os comunistas, os anarquistas, os índios...). Mas estava eu fazendo como sempre paralelos entre aquela época e a nossa e percebi isso: de fato, vivemos (1ª pessoa do plural porque estou incluindo a mim e os da minha laia) uma época sem fé, sem lei e sem rei.
Não é uma crítica, tampouco uma ode, mas quem é do meio intelectual entende que vivemos de desconstruir, de duvidar, de discutir tudo e qualquer coisa que exista na nossa cultura. Vivemos tanto de discordar de nossa própria cultura que acabamos nos marginalizando dela, assim vivendo sem a fé, a lei e a rei do status quo. Tem, é claro, seu lado bom e seu lado ruim.
Ah, como é bom viver segurando nossas próprias rédeas! Sem rituais, livres e puros como os bons selvagens... Pois é, paramos aí: caímos num conto, isso não é verdade. A verdade é que por mais que neguemos, por mais que nos rebelemos, não existe um mundo sem lei, nem ao menos sem fé ou sem rei. O mundo é regido por leis, nem que sejam físicas. Nós ainda temos fé, pois o mundo não é 2+2=4. E ainda temos rei porque acabamos nos submetendo ao que fulano disse, sem a mesma subserviência, mas admitamos que não tiramos nossa ideia do mundo ideal de Platão.
Mas estou sendo exagerada porque em certo grau e por isso mesmo – porque na nossa língua não existe o l, f, r – acabamos por duvidar e desconstruir até nos mesmos o tempo todo (minha psicóloga falou pra eu parar de fazer isso...), o que eu acho ótimo, mas deprime.
E esse, meus queridos, é o motivo pra tanta tristeza. Eu aceito em parte o discurso político, mas calma lá, nem tudo é por essa via! Agora entrou em voga dizer que depressão ou doenças mentais vêm do consumismo. Porque a gente deseja coisas supérfluas umas atrás das outras que acabam não nos preenchendo.
Mas convenhamos, caro amigo, quem não tem desejos que não preenchem? Veja só você, digamos, que sonha com o estado comunista, se um dia isso realmente acontecesse será que você ficaria feliz para sempre e fim? A vida não é um conto de fadas e a gente sabe, justamente, nós os tristes, que não existe ambição na vida – utópica ou não, supérflua ou não – que nos preencha ao ser alcançada. E não somos zen budistas. Ou somos, mas na ausência do desejo estamos longe do nirvana.
O que não quer dizer que nos acomodemos, que não sonhemos, às vezes. Pelo contrário, sem o amparo de um discurso político fanático talvez façamos muitas vezes algo relevante para a sociedade. Ou você espera que dizimando o povo de fome um dia eles farão alguma revolução? E acha que uma revolução de famélicos à margem da sociedade será às mil maravilhas? E trata como meros ovos que servem para fazer uma possível omelete pessoas que morrem de fome! Oras, compreendemos sim que o sistema é injusto, no entanto, sabemos que qualquer sistema será sempre injusto a partir do momento que negamos os nossos e não vimos melhorias. Que diferença há entre uma bandeira que dizia: liberdade, igualdade, fraternidade.... e que deu nisso que estamos agora e outra bandeira igualmente falando de igualdade cabeceada por um ditador? Vai relativizar o sentido de igualdade assim lá longe!
Igualdade... igualdade! Existe até quem fale em “igualdade na diversidade”. Bom, me definam igualdade!
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