quarta-feira, 28 de julho de 2010

Nirvana

Saiu do escritório para pegar um cafezinho. Na volta, olhou para os colegas, para o seu computador, para o carpete cinza e para as mãos – e para o café quente nos copinhos minúsculos de plástico, um dentro do outro para não queimar os dedos. Neste instante alcançou um súbito nirvana, compreendeu, num misto de epifania e déjà vu (para não dizer que tudo era assim, tão religioso, dado que era um fato – e ela sabia disso – bastante vulgar), que ela, o escritório, os colegas, os dois copinhos, tudo, era uma coisa só.
E se sua mente vagasse para fora da janela, e para muito, muito longe, mesmo no ambiente mais diverso, nas florestas, entre os insetos, todos eram não mais que ela e ela todos eles. Sem pretensão ou mágoa. Todos eram um só, pura e simplesmente, como o copinho dentro do copinho de café se uniam, se fundiam, para um só conteúdo. Um só corpo. O conteúdo já não sabia o que era ou se estava ligado com o copinho tudo sendo um só: continente e conteúdo. E nem ao mesmo seria justo dizer que ela realmente pensava sobre tudo isso – ou que sua mente vagueava. A verdade é que ela sentia tudo isso: que era parte de tudo.
Feita a descoberta, sem que percebesse foi sumindo, como se sugada pela essência do todo. Foi ficando transparente sem que ninguém notasse, foi virando a sua cadeira de escritório, foi virando tudo. Ela talvez tenha lutado, mas a sensação era mais forte e a sugava para o vórtice do nada. Ou seria melhor dizer do tudo? A verdade é que o que ela sentia é que, acima de todas as fusões, a fusão máxima do mundo era o tudo e o nada – e era por isso que desaparecia. O copinho caiu no chão, o café fundiu com o carpete cinza, deixando uma mancha. Ela, não, fundiu-se com a cadeira giratória sem deixar sequer uma nódoa.

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