quarta-feira, 11 de junho de 2008

Na conjetural Ursprache de Tlön

Numa dessas brigas bobas que eu tive com o Eros, ele ficou tristonho mela enésima vez porque eu sempre citava o nome do Daniel. Oras, é o mesmo que citar “mãe”, “meu cachorro Scoob” , “minha ex-amiga Stephânia”, “Enrico” ou “Diego”, são pessoas que foram ou são importantes pra mim, não dá pra não fazer citações se eles estão presentes dentro da minha formação e, portanto, dentro do meu discurso. Pelo menos lá na minha bibliografia final teria que ter todos eles. Mas Eros é o que próprio nome diz, uma pessoa muito ligada ao sentimento e que simplesmente não entende isso como eu não entenderia, é óbvio. Discorro sobre isso porque é de importância fundamental para o entendimento dos meus queridos leitores (que, paradoxalmente, só inclui o Eros) quanto as possíveis supressões do nome do meu ex-namorado, ex-amigo, ex-colega, ex-pessoa-relevante-no-mundo Daniel. E que começou assim:
Depois de ficar tristonho, brigar e se reconciliar, Eros se levantou da cama e foi para a cozinha (que fica visível da cama, já que o apartamento em que moro, mais uma vez, não tem cômodos). Eu, ainda deitada, me prometia, contrariada, nunca mais citar o nome da pessoa supracitada (não o Eros, a outra pessoa... vocês entendem). Ele pega uma panela pra fazer pipoca.
– Você trouxe uma tampa que não cabe em nenhuma panela.
– Hum... o.o... é que é...
– O quê?
– É... é d’Aquele Que Não Deve Ser Nomeado...
Desde então este é o codinome conferido à pessoa supracitada que não é o Eros mas sim a outra pessoa (que também não é minha mãe, nem o Scoob, nem a Stephânia, nem o Enrico, nem o Diego).

Mania depressiva

Numa das elucidativas noites que tive depois do término do meu primeiro namoro (relembradas sempre não porque isso tenha me marcado, apenas, mas porque foi uma experiência importante que eu jamais tinha tido – e eu fico feliz de ter tido porque: 1- minha experiência de mundo estaria incompletíssima sem esse dado e 2- porque Aquele Que Não Deve Ser Nomeado nem era tão bom assim) eu lembro de ter chegado a uma conclusão: se eu tenho culpa de algo, é por causa dessa merda de mania depressiva que eu tenho. Relembrei isso ontem, num daqueles acessos histérico-depressivos de sempre e ao qual eu submeti o meu futuro marido (eu sempre submeto alguém). Em certo momento, para dilatar ainda mais minha infelicidade com o mundo, o Eros ficou tristonho pela quadrocenésima vez e disse: “Eu me sinto inútil”. Bom, isso me lembrou do Rafael, quando eu contei do término do meu extinto (pra ficar bem claro para os leitores mais sentimentais) namoro e ele me falou:

(9:05 PM) Rafael Henrique: mas tem uma coisa que eu nunca entendia
(9:05 PM) Rafael Henrique: vc amava ele, ele era o seu porto seguro
(9:05 PM) Rafael Henrique: mas vc nunca estava feliz com sua vida
(9:05 PM) Rafael Henrique: eu ficava pensando que ele era um peso morto a seu lado
(9:06 PM) Rafael Henrique: te deixou pela própria incapacidade de lhe fazer feliz...

Então isso me lembra, dentre outras coisas dessa memorável conversa, de frases e frases que ele me disse sobre auto-suficiência (coisa que, não adianta, eu não acredito bem fundamentadamente – as pessoas podem viver sozinhas, mas não vivem nem 50% bem, a não ser que seja um misantropo (e eu sou até bastante misantropa), não existe tal coisa, antes de mais nada nossa sede reprodutiva precisa ser saciada), e me lembra também que nessa noite, ou em noite anterior, ou em noite posterior (grandes dificuldades em me situar no tempo), eu fiquei pensando que perdi minha mãe, perdi o que não deve ser nomeado, perdi vários amigos, perdi tudo e qualquer coisa, realmente, por essa minha constante infelicidade com minha vida (única companheira fiel, pelo jeito). E que ontem, se eu estava infeliz e angustiada, se o Eros conseguiu amenizar um pouco, desabou com tudo por ser simplesmente sincero. Oras, certeza de que ele vai me deixar por causa disso daqui a pouco também. Óbvio. Óbvio também que ele vai dizer que não, mas vai deixar mesmo assim. Assim como todo mundo: cachorro, mãe, amigos, pra não citar os namorados com amores eternos já que ninguém gosta de ser comparado.
Mas, antes que duvidem do meu amor, vamos à minha justificativa.

Capítulo 3 - Da justificativa

Oras, se o próprio Rafael falava em auto-suficiência, que contraditório falar em ”peso morto ao meu lado”! Se as pessoas não precisam de outras pra nada, as outras pessoas não podem ajudar. Se é assim, eu sou auto-suficiente na minha maneira de encarar mal a vida. Porque então alguém faria ou não alguma diferença na minha maneira de ver o mundo?
Mas eu, que acredito sim que ter alguém do lado ameniza um pouco as coisas e as melhora, se é quase um axioma que amar faz a gente enxergar a vida com lentes cor-de-rosa, seria possível de se afirmar que não amo porque continuo rabugenta com a vida? Claro que não! Qualquer pessoa que entende um pouco de colorimetria e tinge os cabelos sabe de outra máxima: “Tintura não clareia tintura”. Então, pra ficar ainda mais claro tudo o que digo aqui, ilustrarei.
Eu enxergo o mundo assim:

Amando eu enxergo o mundo assim:

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