sábado, 13 de dezembro de 2008

Sobre como conheci o Eros

É sabido que o Eros tem vergonha do modo como nos conhecemos, eu só descobri isso quando minha sogra, um dia num almoço enquanto esperávamos sentadas o Eros pagar o caixa, perguntou pra mim "como foi que vocês se conheceram...? O Eros disse pra mim que te encontrou na rua... como foi isso?". E eu só fiquei uns segundos boquiaberta: "como assim na rua??? Ele mentiu! Eu não fazia idéia do que dizer, afinal... na rua? Como se conhece alguém assim, de repente, na rua? Foi aí que na minha mente se passaram milhares de possibilidades do tipo: "Sim, conheci ele quando estava fazendo ponto na esquina, ele me perguntou onde eu tinha conseguido aquela meia-arrastão em forma de teia de aranha tão interessante, então eu fui com ele até onde ficava a loja e ele me pagou uma hora inteira de sexo sem nem ter usado, apenas porque gastei 5 minutos levando ele até a loja do outro lado da calçada. Achei ele tão gentil que quando ele disse que estava se sentindo inseguro em contar para família que era travesti durante a noite, eu me ofereci na hora pra ser a namorada de fachada dele, e foi assim que nos conhecemos!". Mas já que estamos próximos ao natal e eu já perdoei o Eros por isso há muito tempo com todo meu espírito natalino antecipado, fiquei imaginando ultimamente como a gente poderia ter se conhecido assim, sem parecer que eu dou pra qualquer cara que eu encontro na rua.
Possibilidade 2:
"Estava eu passeando perto de casa quando um homem de meia-idade me parou na rua para perguntar uma coisa, era o Eros. As primeiras palavras dele para mim eu nunca esqueço: 'você sabe onde fica a boate Country's Oxside?', foi aí que notei que ele estava todo vestido de vaqueiro, com uma calça super apertada que mostrava bem saliente a região da virilha. Foi amor à primeira vista..."
Possibilidade 3:
"Estava eu indo comprar pão quando um senhor já de idade me abordou: 'moça, você tem um trocado? Minha irmã está com apendicite e eu precisei vir lá de Tocantins pra cá trazê-la pro hospital porque só aqui eles fazem esse tipo de cirurgia complexa e arriscada e agora preciso voltar pra casa, estou sem dinheiro pra passagem e não posso faltar no trabalho...', era o Eros. Olhei a minha carteira: tinha exatamente o valor da passagem para Tocantins, segundo ele. Dei todo o meu dinheiro (passei aquela tarde só com torradas e bolacha água e sal). Ele me agradeceu: 'deus te abençoe e te dê o dobro em troca'. Só descobri que era golpe um mês depois, quando ele me abordou de novo sem querer dizendo que não tinha dinheiro pra comprar remédio pra filhinha... Eu disse: 'eu não te conheço de algum lugar?', foi tão divertido que ele me deu até o número de telefone dele. Nos falamos até hoje... e ele me dá dicas pessoais de como extorquir dinheiro fácil. Se não fosse por isso, não teríamos nem como comer esse macarrão hoje."
Possibilidade 4:
"Estava eu indo assistir um filme quando um ancião me parou na rua, em frente à porta do Cineluz: 'desculpe, filhinha, mas você pode ler aqui pra mim a sinopse desse filme? A letra é muito pequenininha e eu não consigo ler, sabe como é...', era o Eros. Fiquei com pena e li pra ele a sinopse – a letra não era tão pequena assim, se não me falha a memória, era arial tamanho 12. Ele ficou tão agradecido que me comprou uma pipoca doce e, como íamos ver o mesmo filme, fiquei com dó e me convidei pra sentar ao lado dele pra ler a legenda ou dublar mais alto, caso ele não escutasse bem. Ele se mostrou um senhor tão bondoso e educado que acabei me apaixonando por ele... sabe como é, ele me lembrava um pouco o meu pai..."
Possibilidade 5:
"Estava eu sentada num dia ensolarado no banco da pracinha, olhando a fonte e os engraxates passarem, quando notei que do outro lado estava um senhor alimentando os pombos. Era o Eros. Sorri educadamente e ele não se contentou em só sorrir de volta, veio se sentar do meu lado – contra a minha vontade, pra ser sincera. Ele me disse: 'que dia lindo, não, mocinha?' e eu respondi 'é, né...'. Ele continuou meio envergonhado: 'mas não mais bonito que você...', sem graça, mas acostumada com elogios o tempo todo como sou (ú_u), retornei um 'obrigada' meio tímido, me desculpei e saí andando. Não adiantou. Ele foi tão insistente que acabei dando meu nome, meu telefone... e cá estou eu, com ele. Ele é insistente quando quer algo, não?"
Possibilidade 6:
"Estava eu cheirando cola na rua, já há uma semana sem tomar banho, mas o Eros não se intimidou, veio falar comigo: 'Sabia que com um banho você ficaria muito linda?'. Eu respondi: 'Obrigada, tio, mas me passa a grana se não eu te encho de furo' – eu tinha enfiado a mão por debaixo da minha blusinha imitando um estilete com o dedo, como eu já estava já acostumada a fazer. O Eros não se intimidou, pegou calmamente meu dedo por baixo da blusa e disse: 'eu sei que você não faria isso... você não está com fome? Venha aqui comigo que eu te compro uma coisa'. Ele me levou no subway... nunca tinha comido um sanduíche tão gostoso num lugar tão de gente bacana, ele acabou me comprando até um cookie! Fiquei encabulada, mas ele disse: 'de agora em diante não quero mais que você cheire cola, muito menos fique sem trocar de roupa desse jeito, você vai morar em casa comigo, aceita?'. O que eu podia fazer? Acabei indo... percebi que como eu, com ele morava uma porção de criança, a maioria meninas da minha idade – se não me engano acho que todas era meninas da minha idade... Eu não sou ciumenta, sabe? Ele me disse que se eu viesse aqui almoçar com a madama e me comportasse direitinho ele me deixaria até voltar a fumar crack, aí eu cedi..."
Na minha cabeça ainda pululam histórias românticas de como eu conheci o Eros no meio da rua, tal qual ele sonhava ter me conhecido... mas, depois de muito pensar, decidi ficar com a realidade mesmo, por mais que seja vergonhoso conhecer alguém do jeito que eu o conheci...

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